Revista Istoé: 16/06/2004 Seção: Boa forma
O Pilates, método que integra o corpo e a mente, conquista brasileiros e famosos
Juliane Zaché, Liana Melo e Osmar Freitas Jr.
Colaborou: Lena Castellón
Tente visualizar o seu corpo como se fosse uma orquestra sinfônica. Cada músculo corresponde a um instrumento com som e melodia próprios. Tudo na mais perfeita ordem. Sem que nota alguma soe desafinada, sem que um arranjo grave se sobreponha a um agudo. Assim, a música ecoa de forma agradável e prazerosa.
A analogia serve para explicar um pouco como funciona o método que é a febre mundial do momento. Trata-se do pilates, uma técnica que procura trabalhar músculo, tendão, vértebra e osso de forma harmônica para fazer o corpo funcionar como uma música melódica.
A modalidade desenvolvida pelo alemão Joseph Pilates aportou primeiro nos Estados Unidos, para onde havia se mudado na década de 20, quando abriu seu estúdio em Nova York, atraindo basicamente bailarinos. Hoje, nada menos do que seis milhões de pessoas estão lotando academias de pilates naquele país, segundo dados da Pilates Method Alliance (PMA), organização internacional dos profissionais da área.
E entre seus fãs figuram estrelas do quilate de Madonna, Julia Roberts e Brad Pitt. É um exército que movimenta uma indústria de US$ 18 bilhão anuais.
Até o início dos anos 90, quem perguntasse a um americano o que era pilates seria capaz de ouvir: “É aquele do julgamento de Jesus.” Nos dias atuais, possivelmente diria que é um método que ajuda a corrigir a postura e melhorar a flexibilidade. “Nos anos 60, a técnica ainda era vista como uma espécie de clube fechado.
Reunia seguidores apenas entre os dançarinos. O grande público não conhecia o segredo da boa forma física desses profissionais”, diz Kevin Bowen, co-fundador da PMA. Mas, 30 anos depois, a geração que na década de 60 estava curtindo sexo, drogas e rock’n’ roll começou a pagar o preço dessa esbórnia. Dores lombares, pernas fracas, articulações e músculos rígidos, como metal enferrujado: o pessoal entrava na meia-idade com o corpo em petição de miséria. No entanto, a era trouxe também consigo a onda do culto às celebridades. E foi por isso que pilates entrou no vocabulário e agenda dos cidadãos comuns.
O início de tudo: Joseph Hubertus Pilates nasceu em 1880 na Alemanha. Na infância, sofria de asma e raquitismo. Desde cedo tornou-se obcecado em superar suas limitações físicas. Ainda adolescente, foi ginasta e mergulhador. Aos 14 anos já estu-dava anatomia e os fundamentos da medicina oriental. Com o tempo, criou o método pilates.
Durante a Primeira Guerra, pôde comprovar o resultadode sua criação. Para ajudar na recuperação dos feridos de uma enfermaria, propôs seu programa de exercícios. Em 1926, migrou para os Estados Unidos, onde finalmente abriu seu estúdio em NY.
Joseph viveu até os 87 anosarticulações e músculos rígidos, como metal enferrujado: o pessoal entrava na meia-idade com o corpo em petição de miséria. No entanto, a era trouxe também consigo a onda do culto às celebridades. E foi por isso que pilates entrou no vocabulário e agenda dos cidadãos comuns.
Celebridades – Há cinco anos, a atriz Sandra Bullock chegou a um consultório gritando de dor na coluna. O diagnóstico: lordose. “Meu médico me deu analgésicos suficientes para superar a crise e receitou sessões contínuas de pilates. Nunca mais senti dor nas costas”, diz a quarentona, que ainda mantém corpinho e flexibilidade de mocinha. Como ela, mais de 250 nomes famosos entraram nessa onda. “Nossa geração supostamente vai passar a barreira dos 100 anos de idade. Assim, é preciso estar preparado para enfrentar essa maratona. Pilates me parece o melhor remédio”, afirma a atriz Sharon Stone, 46 anos.
No Brasil, não é diferente. Engrossam a lista de seguidores do método atrizes como Maria Fernanda Cândido. Muitas vezes, entre famosos e anônimos, um dos atrativos do método é a capacidade de transformar o cotidiano. É o que atesta o também ator Guilherme Piva, 36 anos, do Rio de Janeiro. “Minha vida mudou”, garante.
Ele frequenta aulas semanais há três anos. Dores musculares e indisposição física, efeitos da modernidade e do excesso de trabalho, saíram da sua rotina. Apesar de ter chegado aqui somente no início dos anos 90 e ainda não haver números precisos sobre a participação do método no mercado, há sinalizadores de crescimento. Prova disso é o interesse cada vez maior das mega academias pela modalidade.
Ele frequenta aulas semanais há três anos. Dores musculares e indisposição física, efeitos da modernidade e do excesso de trabalho, saíram da sua rotina. Apesar de ter chegado aqui somente no início dos anos 90 e ainda não haver números precisos sobre a participação do método no mercado, há sinalizadores de crescimento. Prova disso é o interesse cada vez maior das mega academias pela modalidade.
A Runner, de São Paulo, por exemplo, vai inaugurar suas aulas em julho. E a frequência naquelas que já dispõem da técnica é considerada alta. Na Fórmula, também na capital paulista, a prática conquista adeptos nas duas apresentações conhecidas: nos aparelhos (dispostos no que se chama de estúdio, uma sala equipada com as traquitanas que permitem exercícios horizontais e verticais) e no solo (conhecida como mat pilates).
A modelo Bianca Bizello, 25 anos, é seguidora do pilates há três anos. “Quando você olha do estúdio, dá vontade de fazer de tão curioso que é. E quando você pratica percebe como tudo se reorganiza no corpo. Passei a prestar atenção na maneira como ando e até como fico parada. E minha flexibilidade melhorou”, conta. Expansão – A modalidade ganha espaço do mesmo modo que a ioga. Entra nas academias e se propaga na forma de casas exclusivas de pilates. A professora Alice Becker, de Salvador, é uma das propagadoras da modalidade. Montou seu primeiro estúdio em 1991, na capital baiana.
Ela tinha conhecido o método no ano anterior, na Califórnia. Atualmente, Alice coordena nove centros no Brasil, reunindo um total de 1.300 alunos. E há previsão de abrir ainda este ano filiais no Rio e em São Paulo. Como ela, outros instrutores expandem seus domínios País afora.
“Nossa geração supostamente vai passar a barreira dos 100 anos. É preciso estar preparado para enfrentar essa maratona. Pilates me parece o melhor remédio”, diz Sharon Stone, atriz, 46 anos
Enquanto os estúdios se multiplicam, cursos de formação são cada vez mais procurados. Quem deseja se habilitar precisa ser graduado em fisioterapia, educação física ou balé e se dedicar no mínimo um ano ao aprendizado. Em São Paulo, a professora Inélia Garcia é uma das instrutoras que ajudam a certificar novos especialistas. Chilena radicada no País desde 1980, ela aprendeu o ofício em 1994 com a sucessora de Joseph Pilates, a instrutora Romana Kryzanowska. Outro curso que auxilia na tarefa é o Centro Formador de Profissionais de Pilates (CGPA), também em São Paulo. Somente este ano sairão de lá 40 novos professores do método.
É importante esclarecer que os princípios do pilates são sempre os mesmos, mas com o passar do tempo alguns seguidores fizeram adaptações. É óbvio que existem os discípulos fiéis. Porém, quem fez um ajuste aqui ou ali se baseia no fato de que é necessário adaptá-lo à evolução do corpo humano. Contendas à parte, a motivação que leva praticantes e profissionais a serem atraídos pelo método é o fato de ele ser completamente diferente dos exercícios convencionais praticados na academia.
Lúdico – No pilates, não existe aquela série de repetições enfadonhas e cansativas, comuns em algumas atividades. Cada movimento é feito no máximo oito vezes. “O que importa é a qualidade do movimento, e não a quantidade”, explica Raul Rachou, bailarino e instrutor de pilates de São Paulo, que conheceu o método com sua mãe, Ruth Rachou, uma das principais difusoras da técnica. Por isso, ninguém sai da aula exausto ou com aquela sensação de corpo moído. Mesmo novatos como a carioca Georgiana Moraes, 51 anos, filha do poeta Vinícius de Moraes. Ela pratica a técnica há apenas um mês. “As aulas são superlúdicas. Sinto-me uma criança”, conta Georgiana. Ela se movimenta em aparelhos e utiliza grandes bolas nas sessões orientadas pela fisioterapeuta Roberta Barroso.
O principal foco do pilates é dar ênfase ao fortalecimento da região da barriga, que se chama de casa de força ou power house. Os exercícios são feitos para tornar o abdome rígido. “Joseph Pilates defendia que um abdome fortalecido ajuda a dar sustentação à base da coluna”, afirma a instrutora paulista Maria Cristina Rossi Abrami. Outro ponto fundamental é manter o alinhamento postural durante as atividades. A respiração tem papel importante na execução do exercício. “E deve acompanhar o ritmo de cada atividade”, completa Sara Marques de Paula, fisioterapeuta e instrutora da técnica. O praticante precisa estar concentrado e atento a todos os movimentos. Assim, a técnica trabalha todos os músculos do corpo e o aluno acaba percebendo a existência deles. “Ele passa a ter o que chamamos de consciência corporal”, explica Eliete Donatelli, instrutora de São Paulo. Foi exatamente essa sensação que Costanza Pascolato, consultora de moda, teve ao fazer sua primeira aula de pilates em 2001. “É maravilhoso tomar consciência do seu próprio corpo e conhecê-lo melhor”, diz. Ela conta que buscou o método porque queria ter melhor qualidade de vida. “Sofri um acidente em 1995, quando caí de um cavalo e fiquei seis anos sem conseguir andar direito.
Já tinha tentado várias opções, mas nada funcionou. Na época, também não estava dormindo bem”, recorda-se. Logo no primeiro mês de prática, Costanza não sentia mais tantas dores no corpo. E depois de três meses conseguia se movimentar normalmente. Peso – De fato, a prática ajuda na reabilitação de pacientes, principalmente com problemas na coluna. Só é contra-indicada quando a pessoa está com o corpo totalmente travado (nesse caso, deve-se buscar antes um tratamento fisioterápico).
O pilates também ajuda no condicionamento físico, já que envolve força na execução das tarefas. E até serve para estimular gordinhos a perder peso. O endocrinologista Filippo Pedrinola, de São Paulo, abriu um estúdio em sua clínica de emagrecimento há um mês. “Como não tem impacto, para quem está acima do peso é bom. E eles se sentem estimulados a seguir em frente”, assegura.
"Meu médico me deu analgésicos suficientes para superar a crise e receitou sessões contínuas de pilates. Nunca mais senti dor nas costas”, afirma Sandra Bullock, atriz, 40 anos, que se queixava de dor na coluna
Com tantas peculiaridades, os benefícios são diversos. Há maior mobilidade das articulações e flexibilidade do corpo, apenas para citar os mais lembrados pelos praticantes. “O pilates melhora a saúde no geral e promove bem-estar”, diz Inélia Garcia. Para proporcionar esses prazeres de modo eficaz e seguro, o ideal é ter um instrutor o tempo todo ao lado do aluno. As aulas podem ser feitas de modo individual ou em grupo de no máximo seis.
Os professores argumentam que só assim é possível ter bons resultados. E esse é justamente um dos motivos que tornam a prática ainda pouco acessível à população. O preço de uma aula por semana individual custa em média R$ 120. É salgado. Se servir de consolo, é igualmente caro nos Estados Unidos, meca do pilates.
As tabelas americanas vão de US$ 60 a US$ 100 por instruções particulares. Na academia Karma Yoga & Pilates, em Manhattan, por exemplo, as instrutoras Christina Galio e Gina Heysek comandam classes mistas a US$ 16 e privadas a US$ 80. Com tudo isso, é de imaginar que maleável também deve ser o bolso. Nem tudo é perfeito.